terça-feira, 23 de julho de 2019

RESENHA: FIQUE COMIGO - AYÒBÁMI ADÉBÁYÒ - HARPERCOLLINS

Saudações, Leitores!

Hoje o vou falar de um livro que desde seu lançamento está recebendo ótimas críticas e do qual tomei conhecimento através da assinatura da Tag Experiências Literárias.

Este é o primeiro romance da autora nigeriana Ayòbámi Adébáyò, a qual foi uma das autoras convidadas da 17ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip 2019). O livro conta a história de uma mulher que tem dificuldades de engravidar do marido e sofre pressão tanto da família dele quanto da sociedade.

O romance é ambientado na Nigéria trazendo aos leitores dados sobre a cultura e costumes, bem como informações sobre a crise política e social relativas ao contexto em que se passa a história.


Sinopse: Yejide e Akin se apaixonaram na faculdade e logo se casaram. Apesar de muitos terem esperado que Akin tivesse várias esposas, ele e Yejide sempre concordaram que o marido não seria poligâmico. Porém, após quatro anos de casamento — e de se consultar com médicos especialistas em fertilidade e curandeiros, tomar chás estranhos e buscar outras curas improváveis —, Yejide não consegue engravidar. Ela está certa de que ainda há tempo, mas então a família do marido aparece na sua casa com uma jovem moça que eles apresentam como a segunda esposa de Akin. Furiosa, chocada e lívida de ciúmes, Yejide sabe que o único modo de salvar seu casamento é engravidar. O que, enfim, ela consegue — mas a um custo muito maior do que poderia ter imaginado.
Um romance eletrizante e de enorme poder emocional, Fique comigo não apenas debate as questões familiares da sociedade nigeriana, como também demostra com realismo as mazelas e as dificuldades políticas enfrentadas pela população desse país nos anos 1980. No entanto, acima de tudo, o livro faz a pergunta: o quanto estamos dispostos a sacrificar em nome da nossa família?”




➤ FICHA TÉCNICA
ISBN 13 - 9788595083202
CATEGORIA - Ficção
TAMANHO - 13,5 X 20,8
ANO DE LANÇAMENTO - Outubro/2018
PÁGINAS - 240

Até agora esse foi o meu livro favorito da Tag Inéditos, pois é uma obra incrível sobre dor, resistência e superação com uma narrativa fluída e cativante.

O livro apresenta a história de Yejide e Akin, um casal nigeriano que se apaixonou nos tempos da universidade e que tem sua história intercalada por capítulos ora narrados pelo homem e ora pela mulher. Dessa forma, temos uma visão quase simultânea dos fatos pelo ponto de vista de cada personagem.

A obra tem início no ano de 2008, mas volta para a década de 80 a fim de contar como surgiu o o amor de ambos. Apaixonados, Akin e Yejide, combinaram de viver um relacionamento sem poligamia, a qual é amplamente aceita na cultura a fim de permitir que o homem tenha mais de uma esposa. A existência de mais de um casamento é incentiva, eis que permite que haja mais herdeiros, mas o casal acredita que seu amor é suficiente para trazer felicidade.

"Amei Yejide desde o primeiro momento. Não tenho dúvida. Mas há coisas que nem mesmo o amor é capaz de fazer. Antes de me casar, eu acreditava que o amor podia tudo. Porém, logo descobri que ele não era capaz de suportar o peso de quatro anos sem filhos."

A história é muito rica na cultura Iorubá e na narrativa do contexto político da Nigéria, bem como aborda de modo franco a questão da maternidade e do papel da mulher em meio as crenças e ritos locais.


"Eu tinha esperado a vida inteira por um filho, um filho meu, uma criança para quem eu pudesse contar histórias. Não estava disposta a esperar nem mais um minuto."

Com uma narrativa intensa e muitas vezes de partir o coração vamos tomando ciência do sofrimento de Yejide, pois os anos vão passando sem que ela consiga dar um filho a seu marido. A pressão de ser uma mulher na Nigéria dos anos 1980 soma-se a pressão exercida pela mãe de Akin devido a falta de um neto. É triste acompanhar o passar dos anos e ver como Yejide é destratada pela família e, principalmente, pela sogra. Ninguém se importa com sua dor ou sentimentos!

As pressões sociais aliadas a insegurança e violência da época, quando o medo se fazia presente no cotidiano das famílias, começam a causar um atrito entre o casal. Não apenas Yejide está angustiada com a questão da maternidade, mas Akin também se sente pressionado por sua mãe, razão pela qual acaba tomando série de atitudes que irão repercutir em todo o futuro de sua família.

"Antes de me casar, eu acreditava que o amor podia tudo. Porém, logo descobri que ele não era capaz de suportar o peso de quatro anos sem filhos. Quando o fardo é pesado demais e o carregamos por muito tempo, até mesmo o amor se verga, racha, fica prestes a se despedaçar, e às vezes se despedaçar de fato. Mas, mesmo quando está em mil pedaços aos nossos pés, não significa que não seja mais amor."

Ao longo do livro acompanhamos todo sofrimento de Yejide e as reviravoltas em sua vida, bem como o surgimento de Funmi que culmina no primeiro passo para uma série de eventos transformadores na vida do casal.

Vamos notando que o casal, em que pese todo amor, passa sua vida vivendo de meias verdades sem que haja diálogo, compreensão e intimidade de um para com outro. Não há o encontro de almas no curso do matrimônio, pois eles não discutem seus problemas e até mesmo escondem suas angústias um do outro, o que culmina em afastamento e desilusões mútuas.

"Mas as maiores maiores mentiras são na maioria das vezes as que contamos a nós mesmos. Eu mordia a língua porque não queria fazer perguntas. Não fazia perguntas porque não queria saber as respostas. Era cômodo acreditar que meu marido era digno de confiança; às vezes, confiar é mais fácil do que duvidar."

Não vou dar maiores detalhes sobre o rumo da história para não estragar a leitura com spoiler, mas posso adiantar que se trata de um livro com uma carga emocional intensa e envolvente que acaba penetrando fundo em nossos corações. Não há como não se surpreender ao descobrir as mentiras, segredos e sofrimento que permeiam o enredo da obra.

Com maestria a autora nos envolve nos sentimentos dos personagens. A cada página podemos sentir o véu da mágoa e desespero que estava engolindo Yejide em sua tentativa de ter um filho e salvar seu casamento, bem como vamos descobrindo o egoísmo e as fraquezas de Akin.

"Passava os dias repensando todas as minhas escolhas, retraçando meus passos para trás,  me perguntando se eu realmente tivera escolha, se teria havido coisas que eu poderia ter feito diferente."

Em que pese tenha sentido que os segredos de Akin contribuíram para o drama vivido pelo casal não há como se afirmar que um é o mocinho e o outro vilão, pois o livro aborda também a individualidade humana e como nossas escolhas afetam nosso caminho. A obras traz dois protagonistas que serão esculpidos em todas as camadas inerentes ao ser humano, isto é, terão sua personalidade, qualidades e defeitos dissecados.

Como já mencionei é uma história triste, mas uma leitura indispensável, pois apresenta de modo delicado e intenso questões envolvendo o peso da maternidade na vida da mulher, solidão e amor. Ao final da obra podemos notar que infelizmente há casos em que o amor não é suficiente e que a falta de companheirismo e diálogo pode causa distanciamento e solidão. É uma leitura para deixar marcas profundas no leitor.



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